Startups – Investimento anjo e principais cláusulas contratuais

Investimento anjo - Caputo Advogados

Por Alexandre Caputo e Rafael Duarte*

 

Nos últimos anos, a captação de recursos e investimento em Startups tem crescido exponencialmente. Em 2017, esses investimentos totalizavam cerca de R$ 2,86 bilhões de aportes em Startups brasileiras, observando um crescimento, em apenas 4 anos, um avanço exponencial, visto que, em 2021, o volume de investimento ultrapassou R$ 47 bilhões de reais1.

Existem diversas modalidades e agentes de investimentos e captação de recursos para Startups, tais como Investidor Anjo (modalidade que mais cresce no Brasil e que atua de forma mais incisiva nas fases iniciais da trajetória das empresas), Fundos de Investimentos, Equity Crowdfunding (plataformas online para captação de recursos), Fundos de Venture Capital e, para empresas em estágios avançados, os fundos de Private Equity.

 

A seguir vamos explicar como funciona o investimento anjo e as principais cláusulas do contrato de investimento.

 

O que é o investidor anjo?

Trata-se do investidor, pessoa física ou jurídica, que aporta recursos financeiros em empresas com o objetivo de auferir ganhos decorrentes da venda da participação por um valor significativamente superior ao que aportou inicialmente, o chamado exit

Em geral, o investidor anjo ganha de duas formas: (i) ou vendendo a sua participação para outro investidor (limpeza do captable); ou (ii) se a Startup for adquirida por outra empresa em uma operação de M&A. Em outras situações, também pode ser interessante para o investidor converter a sua participação e se tornar sócio formalmente. Essa última situação ocorre quando o investidor tem interesse estratégico na Startup e não é necessariamente um investidor profissional que tem como objetivo lucrar com a venda da sua participação.

 

Lei Complementar n. 155/2016:

Até 2016, contudo, não existia uma legislação no Brasil específica para proteger esse tipo de investidor. Isso mudou com a promulgação da Lei Complementar nº 155/2016, que incluiu 4 artigos na Lei Complementar nº 123 de 2006 e cuja vigência iniciou em janeiro de 2017.

Com isso, a Lei Complementar nº 123/2006, o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte e também passou a conter, em seu Capítulo IX, quatro novos artigos sobre o investimento em empresas.

Dentre as alterações criadas pelo legislador, está o incentivo às atividades de inovação e aos investimentos produtivos, em prol da sociedade enquadrada como microempresa ou empresa de pequeno porte e a possibilidade de aporte de capital que não integrará o capital social da empresa. Esse último fator representa uma inovação de grande importância para o investidor, tendo em vista que um dos principais fatores adicionais de risco era que o investidor-anjo – sem uma disposição dessas –, além de poder perder a integralidade dos valores aportados (o que é inerente a investimento de risco em startups, o chamado venture capital), poderia, ainda, ser atingido no seu patrimônio pessoal, caso fosse entendido como sócio, mediante a aplicação de incidente da desconsideração da personalidade jurídica

É justamente com o propósito de criar um contexto de segurança jurídica e vedação a fraudes, a lei é expressa ao prever que o investidor anjo não pode atuar como se sócio ou administrador fosse, exercendo atividades em nome da investida. Da mesma forma, é salutar referir que o investidor não terá direito a voto, com o fim de evitar que, apesar de não assim denominado, aja e seja tratado como se sócio fosse.

Como resultado dessa proteção complementar ao investidor anjo, a mudança trazida confere-lhe benefícios inegáveis, visto que a legislação passa a ser clara no que concerne à ausência de responsabilização por dívidas da empresa, de modo que não poderá ser responsabilizado/acionado em caso de falência ou débitos trabalhistas.

Quanto ao prazo de vigência do contrato de participação com o investidor-anjo (modalidade contratual prevista na legislação), referido vínculo poderá se estender por até 5 (cinco) anos. Por sua vez, no caso de investimento com objetivo de fomento à inovação e investimento produtivo, o prazo poderá ser de até 7 (sete) anos.

É importante destacar que os investimentos não são contabilizados na receita da empresa. Isso é relevante porque, se assim não fosse, provavelmente haveria desenquadramento do Simples Nacional, tendo em vista os valores envolvidos. O enquadramento no Simples Nacional tende a ser um fator bem importante para viabilizar a testagem inicial de modelos de negócios, por sua maior simplicidade em termos contábeis e baixo custo tributário em fases de ínfimo ou nulo faturamento. 

Por fim, quanto à remuneração periódica a ser distribuída em favor do investidor anjo, esta se limita a 50% dos lucros distribuídos pela empresa, conforme ainda resta regulado no art. 2º da Instrução Normativa RFB nº 1.719/2017. Além disso, com o objetivo de impulsionar a saúde e a estabilidade da empresa, o investidor só pode resgatar o valor investido após, no mínimo, 2 (dois) anos da data de realização do aporte

 

Como funciona o investimento anjo na prática?

A contratualização da relação de investimento anjo já vem sendo utilizada no Brasil desde muito antes da criação da Lei Complementar nº 155/2016. Como é usual, a legislação tende a servir de meio de positivação daquilo que já existe no mundo real e no caso dos investimentos anjo isso não foi diferente. O mercado precisava de um meio de formalizar essas relações e o fazia, inspirado nos convertible notes – muito utilizados nos Estados Unidos da América –, mediante os contratos atípicos de Mútuos Conversíveis.

Ocorre que, na prática, o mercado seguiu utilizando o CONTRATO DE MÚTUO CONVERSÍVEL, mesmo após o advento da Lei Complementar nº 155/2016, que trouxe essa figura típica do “contrato de investidor-anjo”, o qual não foi efetivamente absorvido pelo mercado. 

No contrato de mútuo conversível, o investidor inicia sua relação com a startup, mediante o empréstimo de dinheiro para ela (mútuo), nascendo aí duas formas potenciais de exigir a quitação do empréstimo feito: (i) devolução do valor emprestado, acrescido dos juros e correção monetária acordados em contrato; ou (ii) a conversão do aporte realizado em participação societária (equity) da investida, conforme a avaliação da empresa acordada entre as partes. Essa modalidade de contrato já existe no mercado brasileiro há mais de 20 (vinte) anos, mas apenas em 2021 oficialmente passou a receber expressa previsão legal, com a inserção do Marco Legal das Startups no ordenamento jurídico.

 

Principais Cláusulas do Contrato de Investimento (Mútuo Conversível)

Como referido, o contrato de mútuo conversível é o modelo contratual mais utilizado no ecossistema de startups brasileiro, ainda que o Marco Legal das Startups tenha trazido uma série de possibilidades contratuais no seu art. 5º, § 1º. 

O contrato de mútuo não possui um padrão, podendo ser estruturado de diversas formas. Em outro artigo, iremos explicar em detalhes como ele funciona, mas a seguir já iremos trazer algumas cláusulas para referência.

Partes;

Considerandos;

Objeto;

Valor, forma de depósito; valuation; percentual;

Conversão e hipóteses de não conversão (Forma de devolução);

Diluição;

Vencimento antecipado;

Veto/voto afirmativo;

Obrigações;

Com ou sem garantia;

Com ou sem solidariedade sócios;

Novas rodadas e direito de preferência;

Downround;

Drag along;

Acordo de sócios ou direitos pós conversão;

Com ou sem lock up para os fundadores;

Confidencialidade, Não Concorrência, Propriedade intelectual;

Multa;

Declarações.

 

É muito importante ressaltar que a lista acima é apenas uma enumeração das cláusulas mais comumente encontradas em contratos de mútuos conversíveis e, de modo algum, compõem um rol exaustivo. Especialmente pelo fato de a lei não prever com detalhes tudo que nele deve constar, as partes são livres para disporem como bem entenderem e assim o fazem rotineiramente. Por conta dessa grande liberdade é que ganha peso a importância de assessoria jurídica especializada no segmento, para que empreendedores consigam participar dessas negociações em condições mais justas e possam chegar à redação que melhor atendam às suas necessidades e aspirações.

 

Considerações finais sobre investimento anjo

Assim, apesar de ser um investimento de alto risco, cada vez mais chamam a atenção dos investidores em decorrência do grande potencial de ganhos. Obviamente, é preciso cuidado redobrado, tendo em vista que estudos mostram que 7 (sete) a cada 10 (dez) empresas fecham as portas em até 5 (cinco) anos.

Isso significa que o investidor pode perder todo o dinheiro investido, mas também poderá ter retorno futuro na casa dos milhões de reais.

Antes de investir é importante analisar os dados da empresa, além dos dados contábeis, sendo igualmente fundamental analisar o potencial de crescimento, inovação, nicho de mercado e qualidade do serviço/produto.

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Saiba mais sobre Startups em nosso blog:

https://www.caputoadvogados.com.br/blog/por-que-minha-startup-precisa-de-assessoria-juridica

 

Confira o vídeo em nosso Canal do Youtube: 

https://www.youtube.com/watch?v=bjGHc2LdF78

 


1Investimento em startups do Brasil somou US$ 9,4 bi em 2021, aponta levantamento. CNN Brasil, 2022. Disponível em: Investimento em startups do Brasil somou US$ 9,4 bi em 2021, aponta levantamento | CNN Brasil. Acesso em: 07 out. 202

 


*Alexandre Caputo – Advogado, sócio do escritório Caputo Advogados; Cursando MBA em Venture Capital, Private Equity e Investimento em Startups pela FGV/SP, Pós-graduando em Direito Societário pela Escola Brasileira de Direito; Pós-Graduado em Contratos, Direito Imobiliário e Responsabilidade Civil pela PUCRS; Diretor na Associação Gaúcha de Startups (AGS);; Palestrante em direito, tecnologia e inovação; Mentor em programas de empreendedorismo e desenvolvimento de negócios inovadores tais como Inovativa, ABStartups, Inovenow, entre outros. Atua na área empresarial com ênfase em Startups e Studios de Games. 

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*Rafael Duarte, Sócio do escritório Caputo Advogados, com atuação especializada em Empresas de Base Tecnológica e Startups. Pós-graduando em Direito Digital e Proteção de Dados; Pós-graduado em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul; Pós-graduado em Direito Negocial Imobiliário pela Escola Brasileira de Direito; Pós-Graduado Direito Imobiliário pela Faculdade Legale/SP; Pós-graduado em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale/SP; Mentor em programas de empreendedorismo e desenvolvimento de negócios inovadores, tais como Inovativa Brasil, entre outros; Membro da Comissão Direito Imobiliário da OAB/RS; Membro da Comissão de Direito Sucessório do IBDFAM/RS.

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