Como realizar o registro de software?

registro de software caputo advogados

*Rafael Duarte

 

Um dos temas mais importantes envolvendo startups e empresas de base tecnológica é a forma de devidamente proteger as suas criações intelectuais, bem como quaisquer outros ativos intangíveis. Tal fato é ínsito à Nova Economia, em que uma das maiores particularidades é ter o seu valor patrimonial e econômico concentrado nos produtos de sua criatividade, ainda que não palpáveis. Dentro desse grande grupo, há especial destaque ao software

 

– O que é o Software?

O software pode ser definido como “um conjunto organizado de instruções escritas em linguagem de programação (código-fonte) para que seja realizada uma ou mais tarefas.”1 Essas instruções são, então, convertidas numa linguagem passível de execução pelo equipamento (chamado de código-executável ou código-objeto). O art. 1º da Lei do Software (Lei nº 9.609/98) consolida a ideia, ao defini-lo como 

[…] a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados’.

 

Dentre os tipos de software, eles podem ser divididos da seguinte forma: a) Software de Aplicação – realiza tarefas específicas (ex.: editor de texto; jogo; navegador de internet ou player de música); b) Software de Programação – serve para desenvolver novos softwares, usando linguagem de programação (Ex.: Coda, Eclipse, Notepad++); e c) Software de Sistema (Sistemas Operacionais) – faz a interface entre programas instalados nos aparelhos e o hardware (ex.: Windows, macOS, Linux, Android, iOS).2

A forma de proteção do software foi objeto de controvérsias na sua origem, uma vez que se tinha dificuldades práticas de se estabelecer a natureza jurídica do software; se o foco recairia sobre o caráter literário da linguagem escrita (passível de proteção como direitos autorais) ou com lastro em seus seus aspectos prático-funcionais (passível de proteção como patente ou modelo de utilidade3

A opção feita nos EUA (país pioneiro na sua proteção jurídica) foi pela via dos direitos autorais, o que foi motivado pelo fato de o software ser formado com base em seu código-fonte (escrito em linguagem de programação). Segundo José de Oliveira Ascensão, podem ser enumeradas 4 (quatro) razões para essa opção legislativa estadunidense: a) o direito do autor confere proteção mais extensa; b) a direito do autor dá proteção automática, sem que o autor precise revelar a fórmula do programa (no caso da patente, precisaria); c) a proteção pode ser estendida a todos os países signatários da Convenção de Berna, dispensado registros individualizados; d) dispensou-se a edição de novas leis, pois bastaria aproveitar as legislações já existentes de copyright.

O que, então, pode ser protegido por registro de software? O registro poderá incidir sobre “qualquer tipo de programa de computador, seja uma ferramenta gráfica, um aplicativo ou um software de gestão de dados.”4 Todavia, “se você tiver apenas uma ideia ou o conceito de um programa, não será possível registrá-lo”5, o que faz com que seja altamente recomendável que o programa esteja suficientemente pronto antes que se cogite do depósito do pedido de registro no INPI. 

 

– Registro com fim probatório, validade e extensão territorial da proteção:

O registro de software, no nosso ordenamento jurídico, não tem finalidade constitutiva de direito, mas protetiva e probatória.6 Nesse ponto, vale ressaltar que o registro é facultativo, conforme dispõe o art. 2º, § 3º, da Lei do Software. Entretanto, em que pese seja facultativo, a sua utilidade prático-jurídica é de altíssimo relevo e tal fato será detalhado nos próximos tópicos. 

Quando se fala em finalidade probatória, significa dizer que o seu criador passa a deter uma arma robusta para ter segurança de que a titularidade do programa “não será usurpada, uma função comprovatória que traz ao desenvolvedor maior segurança de saber que, caso tenha seu software reproduzido indevidamente ou utilizado de forma não autorizada, não precisará discutir ou provar judicialmente de quem é a autoria do programa.”7

O registro do software, a ser feito no INPI, detém validade de 50 anos, a contar do dia 1º de janeiro do ano seguinte ou a partir da sua publicação. Outrossim, quanto à extensão territorial, o registro terá validade e eficácia legal em todos os 175 países que assinaram a Convenção de Berna.8 Ou seja, é seguro concluir que sua abrangência é “mundial, ou seja, o registro de software no Brasil tem validade em praticamente qualquer outro país, não sendo necessário buscar algum tipo de extensão.”9

 

– Vantagens do Registro (e eventual desvantagem?):

Considerando que, para milhares de empresas, a tecnologia é seu principal ativo de negócio, a aptidão para provar autoridade e titularidade é indispensável para que o titular esteja seguro em eventual “disputa judicial por pirataria ou cópia não-autorizada envolvendo esse software.” 10

Com o fim de sintetizar as vantagens do registro, pode-se compilar as seguintes: a) Ajuda a atrair investidores; b) Transmite confiança aos clientes; c) Protege as suas finanças (exploração comercial exclusiva); d) Permite que a empresa participe de licitações; e) Assegura a confidencialidade em relação aos colaboradores.11

Por seu turno, há quem sustente a existência de algumas desvantagens. Uma delas seria o fato de que o registro incide apenas sobre o código do programa de computador, e não a função por ela desempenhada; por isso, a cada nova atualização (por gerar novo código), é preciso promover novo registro para que o software atualizado esteja salvaguardado. Por isso, a depender do número de atualizações, o processo pode se tornar caro.12 Apesar disso, a sua importância é tão grande, que os gastos com taxas devem ser interpretados como verdadeiros investimentos, e não como simples despesas.

 

– Como é feito o registro e documentação exigida:

Originalmente, o procedimento era totalmente físico, o que gerava custos e morosidade prejudiciais a todos os pedidos formulados. Contudo, a contar de setembro de 2017, o processo de registro passou a ser totalmente eletrônico (e-Software), sendo, atualmente, regulamentado pela Instrução Normativa INPI nº 099/2019. Cumpre enfatizar que, hoje, o processo não é apenas facultativamente eletrônico; ele é necessariamente eletrônico, de modo que não se admite qualquer procedimento em papel. 13

Apenas para se ter uma ideia do impacto dessa modificação, em 2018 – apenas um ano após a informatização do processo – mais de 5 mil softwares foram registrados pelo INPI14 e o “prazo de expedição do certificado foi reduzido de cem para até sete dias úteis.” 15

A formalização do peticionamento pressupõe a satisfação de alguns requisitos, formais e técnicos. A documentação formal consiste em: 

  1. a) Formulário do Pedido de Registro de Programa de Computador devidamente preenchido e assinado; b) Comprovante de pagamento da GRU (taxas devidas); c) Autorização para a cópia da documentação técnica; d) Contrato social em caso de pessoa jurídica; e) Autorização do(s)/autor(res) do software , sejam eles funcionários contratados diretamente ou terceiros contratados para a elaboração do software; f) Documentação de cessão de direitos patrimoniais para o real titular do direito se o(s) autor(res) for(em) diferente(s) de quem leva a registro o programa.16

 

Por sua vez, a documentação técnica é composta por: a) Apresentação da listagem do código-fonte; e b) Apresentação das especificações e fluxogramas do software.17

Um dos passos mais importantes do procedimento de registro do software é a criptografia do texto ou do arquivo que contém o código-fonte; isso é feito mediante a geração do resumo digital hash.18 Antes disso, o INPI era obrigado a armazenar a documentação técnica de cada software por todo o prazo de validade (50 anos). Gerado o resumo digital hash, deve-se transcrever o resultado no formulário eletrônico de depósito.19

A utilização do resumo digital hash garante maior proteção, uma vez que cada hash é praticamente único. Pelo fato de o hash ser criado a partir de pequenos cortes de cada arquivo, “qualquer ligeira modificação em um arquivo modifica completamente o seu hash. Esta função também é utilizada, por exemplo, na formação da Blockchain ou para filtrar arquivos iguais ou repetidos.”20

Por fim, quanto aos custos do procedimento, podem ser referidas 3 (três) diferentes taxas: i) Taxa do Pedido de Registro (R$ 185,00); ii) Taxa para Correção de Dados (R$ 185,00); e iii) Taxa de Sigilo (R$ 908,00).21

 

Na publicação de hoje, abordamos o tema do registro do software e como ele pode fazer toda a diferença na proteção das criações desenvolvidas por empresas de base tecnológica. Numa era em que os ativos intangíveis concentram quase a integralidade do valor de mercado de empresas do segmento tecnológico, deixar de lançar mão de uma ferramenta importante como essas pode ser extremamente nociva, especialmente em face de concorrentes desleais. 

 

Para maiores informações e publicações relacionadas com startups, empresas de base tecnológica e studios de games, fique conectado no site e nas redes sociais da Caputo Advogados.

 


1MARCONDES, Rafaela Sobrinho. FAQ – Registro de Software, 2020. Disponível em: https://baptistaluz.com.br/faq-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

2CAVALCANTE, Wanderson. EJUDI, 2021. Disponível em: https://ejudi.com.br/registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.>

3MEDEIROS, Heloísa Gomes. Software e Direitos de Propriedade Intelectual. Curitiba: Gedai, 2019.

4COMO funciona o registro de software? Peduti Advogados, 2021. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/como-funciona-o-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

5COMO funciona o registro de software? Peduti Advogados, 2021. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/como-funciona-o-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

6MARCONDES, Rafaela Sobrinho. FAQ – Registro de Software, 2020. Disponível em: https://baptistaluz.com.br/faq-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

7GLASMEYER, Rodrigo. Registro de Software: por que e como devo registrar um Software?, 2021. Disponível em: https://blconsultoriadigital.com.br/registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

8REGISTRO de Software: o que é e como fazer. Village Marcas e Patentes, 2021. Disponível em: https://www.vilage.com.br/blog/registro-de-software-o-que-e-e-como-fazer/. Acesso em: 29 nov. 2022.

9REGISTRO de software no Brasil: principais dúvidas. Peduti Advogados, 2020. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/registro-de-software-no-brasil-principais-duvidas/. Acesso em: 29 nov. 2022.

10REGISTRO de software no Brasil: principais dúvidas. Peduti Advogados, 2020. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/registro-de-software-no-brasil-principais-duvidas/. Acesso em: 29 nov. 2022.

11ENTENDA a importância de fazer o registro de software. CHC Advocacia, 2019. Disponível em: https://chcadvocacia.adv.br/blog/registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

12MARCONDES, Rafaela Sobrinho. FAQ – Registro de Software, 2020. Disponível em: https://baptistaluz.com.br/faq-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

13COMO funciona o registro de software? Peduti Advogados, 2021. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/como-funciona-o-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

14COMO funciona o registro de software? Peduti Advogados, 2021. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/como-funciona-o-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

15COMO funciona o registro de software? Peduti Advogados, 2021. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/como-funciona-o-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

16COMO funciona o registro de software? Peduti Advogados, 2021. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/como-funciona-o-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

17COMO funciona o registro de software? Peduti Advogados, 2021. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/como-funciona-o-registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

18REGISTRO de software no Brasil: principais dúvidas. Peduti Advogados, 2020. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/registro-de-software-no-brasil-principais-duvidas/. Acesso em: 29 nov. 2022.

19REGISTRO de software no Brasil: principais dúvidas. Peduti Advogados, 2020. Disponível em: https://blog.peduti.com.br/registro-de-software-no-brasil-principais-duvidas/. Acesso em: 29 nov. 2022.

20GLASMEYER, Rodrigo. Registro de Software: por que e como devo registrar um Software?, 2021. Disponível em: https://blconsultoriadigital.com.br/registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.

21REGISTRO de Software. Arena Marcas e Patentes, 2020. Disponível em: https://registrodemarca.arenamarcas.com.br/registro-de-software/. Acesso em: 29 nov. 2022.


*Rafael Duarte – Advogado, sócio do escritório Caputo Advogados, com atuação especializada em Startups, Estúdios de Games e Empresas de Base Tecnológica. Pós-graduando em Direito Digital e Proteção de Dados; Pós-graduado em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul; Pós-graduado em Direito Negocial Imobiliário pela Escola Brasileira de Direito; Pós-Graduado em Direito Imobiliário pela Faculdade Legale/SP; Pós-graduado em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale/SP; Mentor em programas de empreendedorismo e desenvolvimento de negócios inovadores, tais como InovAtiva Brasil, START (SEBRAE), entre outros; Diretor da Associação Gaúcha de Direito Imobiliário Empresarial (AGADIE); Membro da Comissão Direito Imobiliário da OAB/RS e Membro da Comissão de Direito Sucessório do IBDFAM/RS.

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